Texto Miguel Castro Caldas
Encenação Bruno Bravo
Interpretação Anabela Brígida, Bruno Simões, Bruno Bravo, Raquel Dias, Ricardo Neves de Neves, Tiago Viegas
Cenário Stephane Alberto
Figurinos Ana Teresa Castelo
Música Sérgio Delgado
Desenho de Luz José Manuel Rodrigues
Movimento Andas Jens Altheimer
Assistentes de cenografia Alice Alves, Sara Godinho e Susana Portásio
Chefe de construção de cenário David Paredes
Carpintaria Carlos Sampaio, David Guimarães
Serralharia Adalberto
Pintura Fabienne Couvreur
Construção Andas André Pires
Assistente de Produção Andreia Carneiro
Direcção de Produção Mafalda Gouveia
Produção Primeiros Sintomas / Teatro Maria Matos

Estreia sala principal do Teatro Maria Matos > 15 de Novembro de 2007


A história do pai que leva o avô numa viagem para o abandonar num lugar ermo é um tema que tem atravessado a tradição popular ao longo dos tempos.
É daí que parte esta peça, balançando o seu olhar entre um ponto de vista urbano e moderno (a criança que vive num apartamento com os pais e com o avô) e um ponto de vista por assim dizer rural, desaparecido do quotidiano das crianças, mas que subsiste nas histórias que lhes são contadas à noite (hoje as crianças sabem o que é uma galinha pelas imagens dos livros).




O MEU AVÔ ERA PEQUENINO MAS MESMO ASSIM ERA MAIOR DO QUE EU
Se tu és uma criança e eu sou um adulto ouve: então existe entre nós uma diferença fundamental. Eu sou mais alto. Claro que entre vocês haverá uns mais altos do que outros mas nenhum é tão alto como eu. Se eu agora fosse do teu tamanho não conseguia chegar aos pedais porque a minha bicicleta entretanto ficou com umas rodas desmedidas, andam sempre devagar. Tu, se fosses do meu tamanho, ias pensar que estavas à janela de uma torre de uma qualquer Beja. As minhas mãos, por exemplo, posso abarcar a tua cara toda só com uma mão aberta. Portanto ficamos assim, eu com as minhas mãos a olhar para baixo e tu com a tua cara toda a olhar para cima. Mas se esticarmos os braços ainda conseguimos dar um bacalhau. Talvez um dia te lembres de tudo, vá-se lá saber.

Bruno Bravo e Miguel Castro Caldas

CAMPOS DE MORANGOS PARA SEMPRE
Um dia o avô caiu. Depois recuperou, mas a partir daí nada voltou a ser o mesmo. Começou a dizer coisas que todos consideravam disparates, menos o neto. O neto até ficou a gostar mais do avô. Chegou o dia em que levaram o avô para os penhascos, mas as histórias que o ele contava, de campos de morangos e de casas feitas de chocolate, o neto resolveu ir à procura. Ele queria ir sozinho, mas os pais deram-lhe um farnel que estava roto, e o que tinha dentro não era pão mas pedras. Pelas pedras que foi deixando cair pelo caminho, os pais e as mães (este neto tem dois pais e duas mães) puderam seguir-lhe o rasto. O que é que será que vai acontecer?

Quando lemos contos tradicionais, estamos a ler uma coisa arrancada a uma tradição oral. Estamos, portanto, na presença de estilhaços de uma cultura já desaparecida. Apesar disso temos a sensação que permanece algo de essencial, inexplicável. Talvez por ser inexplicável é que se tenha dado tanto azo a adaptá-los ao universo das crianças. Porque a infância também é inexplicável. Não sabemos o que ela é. Nem quando somos, nem quando já fomos. E por não sabermos que coisa seja, é que não podemos escrever para as crianças a pensar que lhes vamos ensinar alguma coisa. Não vamos ensinar nada, nem sequer vamos dizer o que está bem e o que está mal. Vamos apenas levantar o grande mistério das coisas que não têm explicação: as trovoadas, o fogo, as bruxas, a vida, a morte.

A história do pai que leva o avô numa viagem para o abandonar num lugar ermo é um tema que tem atravessado a tradição popular ao longo dos tempos.
É daí que parte esta peça, balançando o seu olhar entre um ponto de vista urbano e moderno (a criança que vive num apartamento com os pais e com o avô) e um ponto de vista por assim dizer rural, desaparecido do quotidiano das crianças, mas que subsiste nas histórias que lhes são contadas à noite (hoje as crianças sabem o que é uma galinha pelas imagens dos livros).

As crianças vivem em apartamentos que percorrem descalças e à noite dão de caras com esse mundo rural dos contos de fadas com que adormecem. Esta peça tenta descobrir esse ambiente entre o apartamento e as altas serras onde desaparecem os avós.

Miguel Castro Caldas